sábado, 29 de dezembro de 2012

Capítulo I - Memórias fotográficas



I – A volta

            Mais um dia pacato, o céu estava nublado mas eu não tinha certeza se choveria ou não. Acredito que minha rotina não deve ser citada, já que seria apenas repetir as mesmas coisas. Como os leitores podem notar, eu tenho um tom depressivo. Tudo que escrevo ou falo parece um pouco melancólico e cinza. Isso acontece em certas épocas, e é bem notável. Nunca fui o tipo de pessoa que demonstra estar feliz o tempo todo. Quando me deprimo, deixo isso bem claro... até minha câmera aparecer.
            Até pensei em tirar foto daquele céu nublado com minha câmera Diana F+, mas pensei que talvez pudesse ficar um pouco escura, e também por eu não conseguir descrever aquele céu, apenas dizer: cinza.
            Fiz meu trajeto para o trabalho de ônibus, não gostava muito de carros, era ambientalista até demais. No segundo capitulo desse livro, finalmente decido escrever quem eu realmente sou: meu nome é Alice, sou formada em Letras, trabalho na maior parte do tempo numa editora, analisando textos e corrigindo palavras.As vezes fazia uma tradução ou outra pra ganhar um dinheiro extra. Bebo e tomo remédios pra esquecer dos problemas, parece algo muito comum pra se escrever num livro. Meu sonho? Escrever um livro e acabar parando na Academia Brasileira de Letras. O que já fez muito de meus professores rirem, coisa muito improvável.
            Perguntava-me todos os dias se eu podia sonhar tanto. Deixando o baixo astral de lado, entrei no jornal e logo subi para meu lugarzinho confortável de sempre, parei na cozinha, peguei mais um copo de café e fui fazer o trabalho do dia-a-dia. Que coisa inesperada.
            Meus pensamentos eram irônicos, mas os fatos realmente eram inesperados. Quando fui cumprimentar Mariana, vi que ela estava com uma expressão estranha, um tanto debochada. Olhei para meu lugar, vi que tinha alguém sentado ali, sem pensar ou analisar, fui direto em direção da pessoa. Que ousadia, quem seria pra sentar no meu lugar? (Consigo ser chata por mexerem nas minhas coisas ou sentarem no meu lugar na maioria das vezes)
            - Com licença – disse com uma voz alta e firme. Li numa revista que isso era impor sua vontade e que era provável que a pessoa ficasse com medo de você, ou algo do gênero. Cheirava a bobagem.
            Quando aquela pessoa se virou. Não. Não era. Não podia ser. Não, não, não, não. NÃO! Ainda bem que eu não falei em voz alta todos esses “nãos”, soaria estranho e ridículo.
            Era ele. Ele. ELE. Pensei em milhares de palavrões, era impossível aquilo. Como ele me achou? Como isso estava acontecendo? Eu estava sonhando? Por que eu parecia uma adolescente de filmes americanos?
            - Oi. – disse ele, levantando-se e mexendo no cabelo. Era evidente que ele também estava nervoso.
            - Oi. – respondi, comecei a sentir um frio tomando conta do meu corpo inteiro. Chamem uma ambulância, estou tendo um ataque cardíaco.
            Mariana parecia se divertir com tudo aquilo, começou a rir alto do próprio destino.
            - Então, espero que você não se importe por eu ter vindo sem avisar.Não sabia seu telefone – continuou nervoso.
            - Não tem problema, hoje o dia não está muito cheio.
            Ficamos num silêncio mortal por alguns segundos, olhando pra baixo, sem saber o que dizer. O que eu poderia falar? Fazia 1 ano que eu não tinha contato nenhum com aquele homem. Ele não parecia ter mudado muito fisicamente, continuava do mesmo jeito com a aparência um tanto bruta, cabelos escuros e olhos não tão dóceis.
            - Quer se sentar? – perguntei, já não sabendo mais o que dizer, todas as ideias passavam na minha cabeça em tão pouco tempo.
            - Sim, claro.
            Puxei uma cadeira na minha frente. Ele se sentou e os segundos de silêncio pareciam lâminas de dúvida me cortando. O que eu faria agora? Já tinha visto essa cena em vários filmes românticos que assisti quando me sentia muito sozinha e sem motivo pra viver. Acho que Mariana tinha razão, eu era um merda de uma dramática.
            - Eu queria passar aqui rapidinho, não quero atrapalhar seu trabalho. – disse ele numa educação que não era muito normal quando convivíamos.
            - Não se preocupe, não está me atrapalhando. – respondi educadamente, como ele.
            - Então, você está feliz? – perguntou. Não sei qual era a intenção da pergunta. Não sei se era uma pergunta educada ou curiosidade mesmo. Várias dúvidas giravam em torno da minha cabeça, perguntei-me se não era velha demais pra sentir tantas dúvidas.
            Após algum tempo pensando na pergunta, respondi falsamente:
            - Sim, eu sou muito feliz.
            - Fico feliz – sua resposta não parecia ser sincera, assim como a minha. – Com o que você trabalha aqui? Finalmente encontrou o que estava procurando?
            Ele me lançou outra bomba no meu colo. Fazia perguntas tão estranhas, que eu analisava todos os dias mas nunca obtia uma resposta satisfatória. Na verdade, eu sentia que nunca iria encontrar o que estava procurando. A vida sempre me levaria a buscar outras coisas, talvez fosse assim com todo mundo.
            - Eu edito alguns textos, analiso pra ver se estão escritos corretamente, traduzo algumas coisas, nada muito especial. – respondi a primeira pergunta, evitei responder a segunda.
            De primeira nem perguntei o que ele andava fazendo, preferia deixar minha mente imaginar ou simplesmente não saber muito sobre isso. Tinha medo da pessoa que estava na minha frente, e isso era a verdade.
            - Olha, eu sei que é muito estranho, mas será que na hora do almoço podemos ir na lanchonete da esquina comer alguma coisa? – começou a rir, seus gestos indicavam que ele estava nervoso. Conhecia todos seus gestos e expressões: de raiva, tristeza, alegria, desespero e nervo.
            - Sim, claro. – respondi sem pensar, muito menos analisar a proposta, mesmo que eu faça isso na maior parte do tempo.
            - Ótimo, venho te buscar.
            Assim que ele saiu, fiquei paralisada na cadeira. Todos os sentimentos começaram a girar em torno de mim, eu devia ter aceitado? Então reconheci que devia arriscar mais uma vez. De vez em quando eu tinha ataques de fazer sem pensar, de maneira livre, assim como eu sentia que era quando não estava me entupindo de remédios pra dormir.
            Mariana pulou da cadeira dela e veio até minha mesa. Ficou olhando e rindo muito:
            - O destino está a favor ou contra você?
            - Não faço ideia. – sorri.
            Eu estava desesperada, minha vontade era de correr e gritar, mas eu estava muito feliz por dentro.
            Na hora do almoço, dei um passo pra algo que eu não fazia ideia de como seria. E eu me sentia bem.

Nenhum comentário:

Postar um comentário